terça-feira, 18 de agosto de 2015




UMA EDUCAÇÃO PARA NOVOS TEMPOS. O NOVO IDOSO COMPETE  POR UMA VAGA NA UNIVERSIDADE.


Por Cicero Augusto

ESTE TEXTO QUESTIONA a ordem política e o pensamento econômico neoliberal que tem orientado e organizado a Educação no país, seguindo o pensamento e espírito disposto no ordenamento jus-ditatorial implantado no país desde 1964, contrário senso ao proposto pelos movimentos sociais, sindicais, e setores progressistas da sociedade civil, que caminhavam na direção da redemocratização do país, e visava a  implantação de valores garantidores dos direitos fundamentais e de cidadania, conforme pensado por grandes educadores, e inserido na Carta Constitucional, mas que não chegaram a atingir a sua plenitude ( foto: idosos discutem novos paradigmas do século 21).


Não obstante vitorioso o movimento popular que culminou com a promulgação da Carta Cidadã de 1988, a Educação continuou orientada e manietada à necessidade primária de gerar se conseguir uma profissão, por um lado, e de gerar e manter mão de obra sempre disponível  para a acumulação do Capital, significando dizer que não chegamos a observar a vitória da Educação enquanto visão de alcance da cidadania plena, e de qualidade para todos, sem distinção de classes ou origens sociais. A visão do que seja "educar", consistiu então em manter o país atado as orientações e centralismo europeu e norte-americano, de onde vem "as novidades  e modismos", a ser adaptados em um país periférico de cultura multifacetada e extremamente desigual, sempre voltado à satisfação do Capital e da cultura dominante. A hegemonia dessa orientação na política, por quase três décadas, permitiu que se aprofundasse o embotamento do pensamento crítico no ensino fundamental e médio, como também adentrou, aos poucos, às universidades. No mesmo passo, as ciências sociais como a sociologia, a  psicologia e a economia, que deveriam romper paradigmas do atraso de país periférico, como avanço do conhecimento adequado para ampliar a qualidade das relações do social e do coletivo, foram se circunscrevendo ao gosto do individualismo competitivo, sem qualquer compromisso concreto em relação a resolução dos  problemas de base e satisfação das necessidades essenciais - incluindo a saúde e  a educação. 
Assim, não devemos admirar que no mesmo ritmo insatisfatório, a filosofia e a pedagogia também viessem a perder terreno, e mais tarde a sua  própria função, como razões de manutenção de uma cultura permanente aplicada ao Ensino tendo a Educação um condão de educar para a vida em toda a sua amplitude.

No Brasil, nunca ousamos criar caminhos novos como saída e rompimento dos pontos obscuros que intercedem e funcionam como verdadeiros bloqueios de comunicação entre classes, culturas e formação intelectual, conforme se estabeleceu a partir do golpe civil-militar de 1964
Até a entrada do seculo 21, completar um curso superior no país, era coisa para muito poucos. É de estranhar que aqui, pessoas ditas politizadas, tenham criticado, por exemplo, o Programa Mais Médicos, em um país que falta médicos, e que ignoravam que em  Cuba, é comum  encontrar um recepcionista de hotel com graduação em economia, ou um motorista de táxi com graduação em sociologia, o que, historicamente rompeu os bloqueios que criam os famosos guetos mentais engessados na faáacia de que a educação superior é mesmo para poucos. Por aqui, continuamos quedados diante dos anti-valores que incidem e faz ruir os fundamentos da escola pública de qualidade, permitindo a formação de uma sociedade com enormes buracos negros na comunicação e acesso à Educação e ao conhecimento. Em tempo que a ONU, lança o programa Educação para Todos (EPT), é preciso ver a educação integral como direito e valores a serem perseguidos por todas as sociedades, e não reduzida à mera função de conseguir um emprego e reproduzir o modelo de produção. É preciso pois, que a função da Educação seja discutida em patamares para além de sua relação com a Economia, de modo a suplantar esta unipolaridade, não dialética e redutora do conceito e que parece engessar as sociedades do Século 21.


 A dialética fez avançar a história. Sociedades de economias centralizadas disputaram com sociedades liberais capitalistas, a hegemonia de ideias e de desenvolvimento por quase um século. A queda do Muro de Berlim, em 1989, é uma data que marcou profundamente a história do pensamento político, entre um período que se permitia a referencia e induzia ao pensamento dialético, para um estágio que emergiu com uma visão equivocada de que, dali em diante estaria extinto o conceito histórico "de luta de classes", muito embora continuássemos  vivendo numa sociedade fortemente estratificada  e vincada nesse mesmo sentido. Foi como se de um momento para outro, pensamento liberal mais o  conceito da democracia formal de per si tivessem poder para resolver todos os problemas sociais, bastando apenas a adesão à "democracia formal" e a "liberdade de pensamento, de expressão e de empreender"! 


Em 1989 o termo "fim da história" apareceu em um artigo de Francis Fukuyama (foto à esquerda) e referia-se a vitória dos países democráticos sobre o comunismo soviético então prestes a ruir. Mais tarde, ele escreveria e publicaria um livro de mesmo nome, "O fim da história", que foi muito festejado e lhe rendeu honrarias acadêmicas, destaque social e muito dinheiro. Entretanto, mais tarde, Fukuyama obrigou-se a fazer correções de rumo,  viu-se obrigado a afastar-se de "apoiadores ideológicos" como George Bush, tamanhas foram as críticas  que recebeu. Os "finalizadores da história" embrenharam-se assim, por becos sem saída. Mais recentemente, Fukuyama afirmou que o capitalismo globalizado põe em risco as classes médias do mundo. O fato é que, sem história, o mundo não pode ter memória, e desmemoriados seguimos sem conhecer o percurso que iniciamos e as balizas que utilizaremos.. 
O capitalismo neoliberal, então reinante começou a ser fustigados por sucessivas crises econômicas, até que, a maior delas, ocorrida em 2007/2008, tendo como epicentro nos EUA, varreu o mundo como um gigantesco tsuname, destronando todas as possíveis certezas impostas pelo modelo de pensamento único defendido pelo modelo neoliberal e unipolar, que exigiu a desregulação do sistema financeiro. A crença até então aceita, de que o "livre mercado" a tudo ajusta, ruiu por terra. Ora, o sistema de economia mesmo aos cacos está a nos dizer: A história continua! O mercado livre não é capaz de ajustar as sociedades num mundo globalizado, muito embora já estejamos, a estas alturas, inseridos nele até o pescoço. O governo americano teve, a seu turno, de intervir na crise bancaria injetando trilhões de dólares para salvar o sistema a sua economia...   
De fato, com a falácia da vitória do liberalismo, não logramos espetaculares avanços. Muito pelo contrário. As guerras de dominação tiveram lugar como nunca, de modo sem precedentes os Direitos Humanos foram violados, os guetos e as desigualdades sociais e econômicas aprofundadas quer seja na comparação entre países, comunidades ou indivíduos. 
Esse imenso fosso criado nas relações que predominam e  influenciam o poder global, deu-se também, e fortemente, porque à idéia de uma educação pública de qualidade não conseguiu se manter e desenvolver-se de fato em várias regiões do mundo, principalmente nos países emergentes. Vale dizer, nesses países, a Educação não se dá como instrumento de aperfeiçoamento das sociedades e até mesmo do Direito, ao menos na intensidade e profundidade que deveria. A política, a seu turno, vem demonstrando passar por sucessivas crises, crescendo a insatisfação com a sua forma de representação, e nada indica que chegaremos a bom termo seguindo o pensamento dominante atual, de que a economia deve pautar a educação, sem abrir espaço e oportunidade de experimentação de estágios dialéticos, possibilitadores da superação desse grande fosso aberto entre política e decisão sobre economia, entre Educação e civilização de fato.

Educar é crescer. E crescer é viver. Educação é, assim, vida no sentido mais autêntico da palavra" (Anísio Teixeira).

Educadores brasileiros como Anísio Teixeira, (1900-1971), Paulo Freire (1921-1997), e homens de pensamento como Darcy Ribeiro (1922-1997) e Josué de Castro (1908-1973), para citar alguns ilustres do nosso século passado, embora gênios em suas atividades e visão de mundo, lograram receber por seus serviços e dedicação à nação, ao invés de honras e reconhecimento contínuo, ora o exílio político, ora um quase desprezo do establishment, com interlúdios de pouco reconhecimento, embora muito festejado por parte de franjas da sociedade. A educação e os educadores não gozam de grande prestígio, ao menos por aqui. 

A experiência com os Cieps: Idealizados no Estado do Rio de Janeiro nos anos 80, por Darcy Ribeiro, foi um marco importante a partir de 1982, implantados no governo de Leonel Brizola. Era um tributo aos grandes educadores como Anísio Teixeira e Paulo Freire e outros, bem como o incipiente reconhecimento da necessidade de uma Escola de Educação de período integral complementada com atividades culturais, voltadas inclusive para crianças de baixa renda e com poucas possibilidades de desenvolvimento sócio-cognitivo sem uma Escola e uma pedagogia à altura.

O projeto entretanto, não ficou sem receber o seu quinhão de crítica bem como ataques e mesmo desprezo que atrasou direitos à educação dos futuros educandos e de implantação de uma nova ideia sobre a questão educacional. Vivemos, infelizmente, em um país onde os planos implementados por um  governo, são derrubados por outro que se segue, e pouco respeito se deu também ao projeto educacional elaborado por Darcy Ribeiro e tão amplamente acolhido pelo governo democrático de Leonel Brizola. Embora tenham deixado desde logo a marca positiva na senda da educação no Brasil, esse Programa Especial de Ensino foi logo abandonado pelo sucessor de Brizola. Os equipamentos então já montados foram  transferidos ou doados a outros municípios, passando a servir para as mais variadas funções, como abrigo de seitas religiosas, academias de ginásticas e outros fins que não educacionais, ou simplesmente acabaram abandonadas e ocupadas por populações sem teto,apesar da concepção arrojada de arquitetura e montagem assinada por Oscar Niemeyer. A construção pedagógica igualmente foi abandonada, perdendo-se todo o investimento, conforme promovido e garantido no governo anterior, tanto em equipamento, como instalações e formação de profissionais, demonstrando o desapreço que se tem neste país pela educação. Esse, ao menos, foi o quadro encontrado em 1991, quando Leonel Brizola reassumiu o Governo do Estado do Rio de Janeiro e retomou o programa como todo afinco. 

Falta a nós, a tradição e o respeito as questões dos direitos sociais, culturais, e à formação para a cidadania. Esses são males que, infelizmente se espalham por boa parte do mundo capitalista que nunca tiveram o tema educação vinculado verdadeiramente à essencialidade da vida como realização ampla e plena. Praticamente desistimos disso, salvo ações como essas, de abnegados. Sem educação de base cidadã para todas as pessoas e idades, os conceitos  críticos sobre a sociedade, bem como a experiência histórica que se agudizou até fins da década de 1980, movido pelo pensamento dialético de luta de classes e que provocou avanços qualitativos, também se estiolou. O passo seguinte foi a disseminação da padronização da cultura pela massificação do consumo, o que possibilitou a  fragmentação do conhecimento, que agora passa a ser suprido quase que exclusivamente por via de programação da mídia hegemônica e televisiva. Assim "educamos" vastas camadas da população, o que contribuiu ao rebaixamento da cultura e coisificação do humano. Em 1989, com a crise do sistema socialista no leste europeu e o fim deste sistema na Alemanha Oriental, junto com o Muro de Berlim caiu também conceitos que amparavam um julgamento dialético no sentido crítico da história e uma oportunidade histórica de, de por meios da critica dialética, obtermos estágios superiores de civilização. A queda do Muro foi considerada um golpe final na possibilidade de se pensar qualquer coisa diferente do liberalismo de livre mercado. Esta estagnação do pensamento crítico, só pode ser superada pela Educação, de forma democrática, aberta e para todos, sem distinção.    

A pessoa idosa e a Educação. Estamos vivendo mais: Muitos idosos hoje, ainda que intelectualmente lúcidos, em razão do aumento da expectativa  de vida, têm excluídas suas possibilidades de realização contando com a assimilação de novos conhecimentos, os quais se somados à experiência de vida acumulada poderiam tirar melhores e mais sólidas conclusões do processo do envelhecimento,  e  contribuir ativa e efetivamente para as transformações sociais e com políticas capazes de romper com o esquema padrão de domínio de poucos sobre muitos, e assim  implantar estágios de cidadania rumo à meta de igualdade de oportunidades em seu sentido pleno. A divisão imposta na sociedade, de centro dominante x  periferia dominada, falha da evolução política e ausência de uma Educação voltada a essencialidade da vida, impacta pois tanto jovens como idosos, dificultando-lhes vencer os obstáculos e a apreensão do processo de conhecimento, isolando gerações e alienando o individuo do verdadeiro processo de  crescimento.

Contra isso, devemos levantar-nos e lutarmos por uma sociedade sem guetos, com oportunidade para todos. Os fatos mostram que precisamos revolucionar nosso modelo de educação, que deve ser de formação crítica e pró-vida. O Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), registrou em 2014, uma crescente demanda de pessoas idosas, acima de 60 anos, que “estão arriscando” e “testando seus conhecimentos”  com o sério desejo de entrar para uma faculdade, seja para melhoria  de currículo, conquista de emprego ou realização de um antigo sonho. Segundo noticia o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), a participação dos idosos vem num movimento crescente: em 2008, o número de inscritos ficou pouco abaixo de cinco mil; em 2009, foram oito mil e, finalmente em 2014, quinze mil. O Centro Universitário IESB, de Brasília/DF,  confirma que o  elevado número de idosos inscritos foi percebido em várias instituições. São aposentados, em alguns casos até mesmo com diploma de nível superior, mas que buscam outros cursos, outros ideais, bem como a  realização de outros sonhos, e que sem medo,  buscam através do ENEM o caminho da concretização.

As crises que abatem sobre as economias, sobre a democracia e a politica está, portanto, a exigir mudanças e correções de rumo em suas áreas para que o quadro geral não se agrave ainda mais; o fenômeno do envelhecimento acelerado das populações em todo o mundo começa a exigir um novo posicionamento quanto a um novo tipo de educação capaz de compreender melhor a dimensão humana, para além da relação educação-trabalho-profissão. É bem certo que muitos jovens de hoje, quando idosos de amanhã, passarão por mais de uma profissão durante o ciclo de vida. A Educação e o arco da existência ganham novas dimensões e significados. 

A história, como queria Fukuyama e como comemorado pelos liberais mais ferrenhos, não acabou. Nós podemos contá-la e dizer o que não funcionou e que, portanto, deve ser melhor elaborado, e nesse processo,a Educação certamente deverá estar no centro e ser referencia para todo o resto!  



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